9 coisas que você não deve fazer ao empreender

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Até certo tempo o “jeito certo” de ter um trabalho ou carreira era escolhendo um único assunto para se estudar, concluindo a graduação e ingressando em uma boa empresa. Ou, então, estudando para um concurso público que garantia estabilidade para o resto da vida.

Pois bem, as coisas mudaram.

A nova economia da comunicação abriu oportunidades para a criação de negócios e produtos inovadores, de baixo custo e distribuídos por plataformas digitais. O avanço das tecnologias nos mostrou que a profissão que existe hoje pode não existir daqui a alguns anos e que da mesma forma profissões impensadas vão surgir e precisar de novas habilidades, as quais nem sempre serão aprendidas em bancos de faculdades.

Entendemos que crianças de dez anos já sabem editar vídeos e tem canais no Youtube com milhões de seguidores. Estamos nos libertando de modelos que durante décadas nos forçaram a ser de um “determinado número”. Estamos descobrindo que podemos migrar de área e nos reinventar.

Nós podemos empreender!

Mas como não nos ensinaram sobre isso na escola, não sabemos exatamente como começar. Quase todos os dias nos empolgamos quando lemos reportagens sobre “a fulana que largou tudo, abriu uma barraca de cachorro quente e já faturou 1 milhão” ou sobre startups de sucesso que investiram pouco e que hoje possuem um valuation de saltar os olhos. Aplicativos “bobinhos” que nos fizeram dizer pra nós mesmos “como é que eu não pensei nisso antes?”.

Mas é justamente aí que começam vários erros.

O problema é que não aprendemos nada sobre empreendedorismo na escola. Não sabemos quase nada sobre direito e economia. São ciências negligenciadas em nossa formação. Eu não quero te desanimar a empreender, pelo contrário. Quero compartilhar um pouco sobre o caminho das pedras. Estamos viciados demais em só contar as coisas boas, mas saber sobre erros, frustrações e riscos também é algo muito rico.

O primeiro erro: achar que sua ideia é a melhor do mundo

Quando temos uma ideia vamos logo nos apaixonando por ela. Achamos que ela é a melhor, que ninguém pensou naquilo antes. Desculpe te trazer de volta ao planeta Terra, mas ideias não tem donos, ideias estão no ar. Ideias são apenas ideias e só se tornam realmente boas quando alguém as executa.

Pessoas com ideias existem aos montes e diariamente eu vejo grupos sobre empreendedorismo recheados de tópicos de pessoas que “tem uma ideia incrível e querem investimento ou um sócio para desenvolvê-la”. Mas não tem nada além disso, nem mesmo uma apresentação e em alguns casos nem a ideia querem contar. Desculpe, mas ninguém vai colocar dinheiro em alguém que tem só uma ideia. Você colocaria? Além do mais, ideia é tipo o 1% de todo um longo processo até que isso realmente vire um negócio. E se sua ideia realmente for boa e bem planejada, não precisa ter medo de compartilhar, porque você sabe como ninguém colocar a cereja no bolo.

A “fulana que ganhou um milhão com cachorro quente” faz parte da exceção, de uma entre milhões que deu certo. O “aplicativo que parecia bobinho” tinha muita coisa por trás que o fez dar certo e precisou ter muita paciência até engrenar (Angry Birds e Pinterest, por exemplo, são cases neste sentido, só depois de muito tempo deram certo e começaram a permitir lucros).

Nem sempre grandes invenções surgiram de um momento “eureka!”

Além disso, quando criamos podemos estar apaixonados e cegos pela ideia, ignorando qualquer risco e aspecto negativo, mas…Quem cria, nem sempre vê o que há de errado.
O segundo erro: empreender para aparecer, por paixão, por hobby

Por inveja de um colega que deu certo (pra mostrar que você também pode), por competição, por aparências, para estar em um palco, para sorrir, por moda, por status, por título, para se dizer CEO, por hobby, para ostentar uma vida que parece livre.

Empreender achando que vai trabalhar menos e que será rico do dia pra noite. Forjar ser um especialista em algo aos 19 anos sem nunca ter colocado a mão na massa. Cair em fórmulas de lançamento e promessas de dinheiro fácil baseadas em lavagem cerebral. E o pior, cair no conto dos gurus que tudo o que fazem é passar o dia postando frases de efeito.

O terceiro erro: empreender sem existir uma demanda

Não necessariamente você deve empreender porque é apaixonado por aquilo. Convém desapaixonar, inclusive. Aliás, existem empreendedores que são bons em identificar demandas e abrir negócios em série, sem que depois necessariamente estejam envolvido no dia a dia do negócio.

Você não deve empreender apenas porque ama aquele assunto, isso é até perigoso. Você pode empreender porque existe uma demanda que o leva a abrir, por exemplo, uma lavandeira em determinado bairro quando você nem ama ou entende tanto sobre esse assunto. Mas mesmo existindo uma demanda por ali você vai ter que entender se aquele lugar e aquele momento comportam aquilo. Aquele bairro não tem lavandeira, ok. Mas as pessoas dali vão gastar R$200,00 por mês naquele serviço? E você, tem perfil pra tocar o negócio no dia a dia a carregar nas costas todas as responsabilidades dele? Você identificou que em um estado longe do seu falta algo, mas você realmente vai ser feliz se mudar pra lá?

E que fique claro, quando digo que você não deve se apaixonar é só pra te alertar o quão perigoso isso pode ser. Você pode ser um empreendedor apaixonado sim, deve. Mas nem sempre o assunto do seu negócio é sua maior paixão ou especialidade. É muito clichê dizer “vou abrir um negócio de marketing porque sou apaixonada por marketing”, mas ser apaixonado por algo não garante que exista demanda ou que aquilo será um sucesso.

Empreendimentos precisam gerar valor/renda e se você apenas abrir um “porque é apaixonado por aquilo”, vai se dar mal. Empreender também está ligado ao seu projeto de vida, aos seus limites, seu estilo, questões familiares, crenças, limitações.

Entender se um produto é viável é bem importante. Por exemplo, holografia já é viável, só que não existe demanda no momento. A sua oferta também precisa satisfazer a demanda, senão vai gerar referências negativas com o tempo.

Nem tudo que é viável convém.

O quarto erro: criar mais do mesmo

“Eu quero ser o novo Google”, disse o garoto de 24 anos que está criando uma startup baseada em ser mais do mesmo, um buscador. É claro que em algum momento alguém vai substituir o gigante das buscas, mas empreender pra ser mais do mesmo ou pra competir com potências não é o melhor. Escrevi sobre isso em se sua marca não é a melhor, então mude seu posicionamento.

O quinto erro: não ter um modelo de negócios e um produto mínimo viável

A modelagem de negócios é um instrumento de planejamento estratégico que sistematiza e representa essas relações para testar a viabilidade e o potencial de um empreendimento.

Negócios requerem planejamento e processos. A primeira coisa a fazer após ter uma ideia é construir um modelo de negócios e pra isso você pode usar o Business Model Generation Canvas, um mapa visual simples de preencher que vai te ajudar muito. Depois, crie um roadmap planejando cenários futuros de até 3 anos e não mais que 10. Estabeleça metas e evoluções em relação ao mercado, produto e tecnologias. Pra isso eu uso a técnica TRM – Technology Roadmapping.

Além disso, um modelo de negócios baseado em uma única forma de monetizar é um enorme risco. Modelos baseados em receita recorrente são melhores do que depender de vender um só projeto caro de vez em quando. Assim como ter um milhão de assinantes pagando 1 real por mês é melhor do que ter um único cliente pagando este mesmo valor, porque nesse caso se ele cair fora você perde tudo, enquanto que no primeiro cenário a chance daquelas 1 milhão de pessoas cancelaram é minúscula – no máximo você vai perder 100 mil.

Negócios que dependem de financiamento 100% público são frequentes no Brasil, já lá fora isso muda um pouco. É comum existirem negócios baseados no modelo 30/30/30, nos quais sua receita não está dependente de uma só fonte. Doações, parcerias, publicidade e financiamento podem ser uma mescla mais interessante e menos arriscada.

Tudo o que é muito dependente de algo é ruim.

Para testar sua ideia, colocá-la no mercado e talvez optar por tentar um investimento é preciso criar um MVP – produto mínimo viável. Para isso é preciso priorizar ao máximo o que vai nele, precisa ser o que é capaz de mostrar sobre o que ele é, sua essência, seu potencial e depois disso ele vai evoluir. Aqui eu gosto de associar o roadmapping com metodologias ágeis de desenvolvimento, como Kanban ou Scrum.

Processo é decorrente do negócio. Conteúdo depende do processo. E o negócio não se sustenta sem planejamento. Portanto, é preciso modelar negócio, processos e produto.
O sexto erro: achar que investimento de 1 milhão é muito ou que existe custo zero

Se você tivesse 1 milhão para investir em seu negócio lhe pareceria tentador, não?

Parecia realmente muito dinheiro. Mas vamos a uma continha básica. Negócios precisam ser planejados e antes de dois ou três anos eles ainda estão crus, não se sustentam. Podemos dizer que ele finalmente deu certo se passa disso.

Então, seu planejamento financeiro precisa distribuir esse 1 milhão em 3 anos, o que equivaleria a 300 e poucos mil por ano, certo? Agora divida esse valor por 12 meses e você chega ao número de aproximadamente R$28 mil por mês. Agora pareceu pouco, hein? Com esses 28 mil você vai precisar contratar pessoas. Suponha que você contrate uma pessoa de marketing por R$3.300 ao mês, com encargos trabalhistas isso aumenta pra uns R$6 mil. Agora contrate outro profissional, vamos colocar aqui um fotógrafo simulando um produto de mídia digital, ele custa R$3 mil ao mês, o que vai virar com encargos uns R$5.600. Ai você precisa de alguém de vendas a um fixo de R$2mil mais comissão e um pró-labore pra você, diretor/dono de R$5.800, que vai virar 10 mil. Pronto, já passou de R$25 mil mensais de gasto e ainda tem café, internet, aluguel, água, energia e outros suprimentos pra pagar. Viu como 1 milhão é pouco? Se você tiver um milhão e não quiser ser planejado, melhor deixar o valor aplicado e vai ter aproximadamente R$9 mil por mês de rendimento.

Se o dinheiro advém de um investidor, não é oba oba. Você vai ter que fazer esse dinheiro voltar pra ele, pagar tudo e ainda ter lucro. E se tudo der errado, qual o plano B?

Ao mesmo tempo, nunca diga que seu negócio tem custo zero. Sempre há custo, sempre! Sua internet, o equipamento, seu tempo. Pode ser custo baixo, mas nunca custo zero. Negócios precisam ter receita suficiente para custear recursos humanos, tecnológicos e financeiros.

Tudo o que puder ser planejado é melhor, mas sempre existirão aspectos que serão imprevistos, cenários impensados.

Num time de futebol temos técnico, treinador, massagista. Por mais que trabalhem em equipe e façam seu melhor, a responsabilidade de fazer o gol é do jogador. No empreendedorismo você é esse jogador.
O sétimo erro: empreender com o amigo ou com gente da mesma área

“Vou abrir um negócio com dois amigos, eles são jornalistas como eu”. Temos aí mais um risco. Amigos nem sempre serão seus melhores parceiros de negócios e ter em sua equipe perfis parecidos com os mesmos conhecimentos também é perigoso. Negócios exigem habilidades diferentes.

O oitavo erro: nadar, nadar e morrer na praia

Diariamente a Folha de São Paulo e o Estadão rodam jornais impressos e os entregam em milhares de casas, tudo isso entre 4h e 6h da manhã. De que adiantaria ter o produto se a entrega não fosse tão efetiva? Isso vale para o seu negócio também, não basta ter o produto. É preciso pensar na logística, na distribuição (que quando se trata de um produto digital foi facilitada no cenário atual), nas vendas, no suporte ao cliente, no marketing, na evolução do produto.

Quando você vai a uma doceria e encontra doces lindos, mas ao prová-los eles estão velhos, temos um grande problema ali.
O nono erro: achar que falir é sempre ruim

É típico do Vale do Silício acreditar que quem já quebrou várias vezes é o cara certo, porque ele sabe como não repetir aqueles erros. Será? Nem sempre. Quebrar pode ser ruim sim, traz experiência, mas é preciso saber o motivo disso. Se foi por incompetência do sujeito, então é um problema. Mas quem é que vai querer afirmar que foi por isso?

Falir pode ensinar muito também, mas é claro que a gente não quer isso. Só não pode vir com desculpa que “o mercado não entendeu o que você queria”.

Empreender pode ser uma boa se você tiver ciência que precisa ser feito de forma planejada. Mais importante que ganhar, é não perder.

Sobre a autora:
Flavia Gamonar é especialista em marketing e inovação, mestra em Mídia e Tecnologia (TV Digital) e professora universitária e pesquisadora sobre inovação.

 

 

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